segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Os movimentos sociais e a república

Os movimentos sociais e a república

Estudar os movimentos sociais que marcaram os anos iniciais da República é importante para compreender as relações de força na política brasileira


 
Movimentos Sociais do início da República. VEJA LINHA DO TEMPO NO FINAL DA PÁGINA

Fim do século 19. Cena 1: o marechal Deodoro da Fonseca, acompanhado dos militares, proclama a República no Brasil. Cena 2: junto com a família real, a monarquia sai de cena. Cena 3: é instaurado um regime que se denomina público e afirma que o povo é soberano. Cena 4: a população, em acordo com a novidade e com os homens no poder, segue a vida. Corta. Sobe o letreiro: "E todos foram felizes para sempre".

Esse não pode ser o filme que passa pela cabeça dos estudantes quando o estudo dos anos iniciais do período republicano é trabalhado em classe. Primeiramente, eles precisam entender que a troca de regime não ocorreu num momento de calmaria. Deodoro da Fonseca concordou em se virar contra dom Pedro II numa época em que a economia estava abalada com a inflação alta e com uma superprodução de café. E ainda havia uma crescente massa de desempregados (acentuada pela libertação dos escravos, que não encontravam lugar na sociedade), o que só piorava a situação.

O professor precisa encaminhar os alunos a compreender também que os primeiros 30 anos que se seguiram não foram um mar de rosas. Além dos problemas já citados, quem assumiu o controle do país foram as oligarquias, não representantes autênticos do povo, como o termo república indica: palavra do latim, significa "coisa pública". "O novo sistema prometeu mecanismos democráticos de participação popular, mas não entregou", diz Rogério Baptistini, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).

Prova disso é que várias revoltas populares eclodiram em pontos distintos do país (leia a linha do tempo que ilustra esta reportagem, logo abaixo). Usá-las para apresentar o cenário inicial do período é uma boa estratégia desde que sejam levadas em conta todas as conjunturas históricas e as reações do governo - que enxergava ameaças monarquistas por todos os lados, segundo Ivone Gallo, doutora em História Social pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Na exploração do panorama, é preciso deixar claro que se tratava de movimentos representativos e sérios. O historiador Nicolau Sevcenko, ao analisar a revolta da Vacina e o reduzido número de mortos divulgado pelas autoridades, chama a atenção para a tentativa desleal do governo de reduzir uma autêntica rebelião social à caricatura de uma simples baderna urbana.

O estudo dos levantes sociais como um conjunto é importante ainda para desmitificar o senso comum que apresenta o povo brasileiro como historicamente cordial. "Os movimentos da Primeira República foram, em sua maioria, muito sangrentos", diz Paulo Machado, professor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A guerra de Canudos, a do Contestado e a Revolução Federalista, por exemplo, são consideradas por Sevcenko as três grandes chacinas da Primeira República em nosso país.

Um alerta: é comum os alunos encararem lutas sociais e políticas como um jogo, onde há dois lados e após uma disputa um sai vitorioso, e o outro, derrotado. Ao trabalhar o tema e a conquista (ou não) das reivindicações, é preciso evitar a ideia de que a resistência social só se efetiva quando as demandas e as propostas dos revoltados são atendidas. "A mobilização dos aparatos do Estado diante de manifestações sociais deve ser considerada na construção de uma noção de resistência também", explica Pedro Henrique Ravelli, professor da Escola da Vila, na capital paulista.

Encadeando os fatos desse modo, levando em conta acontecimentos anteriores e posteriores, é possível ajudar os estudantes a construir um percurso histórico do período da Primeira República com nexo - e adquirir uma bagagem de qualidade para estudar o que vem pela frente no currículo: a era Vargas (leia a sequência didática, abaixo).

Porém, mais do que falar a respeito dos estragos materiais provocados pela Revolta do Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, ou da Revolução de 1924, em São Paulo, é fundamental fazer uma conexão entre elas e a ruptura de 1930, quando Getúlio Vargas inaugura uma nova fase da República. "Foram as elites civis desvinculadas da grande agricultura de exportação e alguns setores da jovem oficialidade militar que conduziram essa mudança", explica Baptistini. Novamente, o povo teria de esperar outra oportunidade para ter voz política ativa no cenário nacional.

 

SEQUENCIA DIDÁTICA
 
Objetivos
- Identificar as diferenças entre o projeto de república que se pretendia construir e as demandas sociais.
- Analisar os levantes como uma forma legítima de pressão e compreender que suas definições estão atreladas a interesses de grupos sociais.

Conteúdos
- Movimentos sociais republicanos.

Ano
9º.

Tempo estimado
12 a 14 aulas.

Material necessário
Título I da Constituição Federal de 1988.

Flexibilização
Os alunos com deficiência visual participam ativamente do debate. Para que falem sobre escravos e imigrantes, questione a turma sobre a descendência de cada um. As principais informações discutidas são registradas no quadro para que o aluno cego possa fazer anotações em braile. A linha do tempo, assim como a Constituição devem ser entregues ao aluno antecipadamente, para que ele estude o material em casa, antes das aulas. A Constituição está disponível em áudio na internet. As respostas em grupo podem ser feitas em uma aula para que sejam trocadas com os colegas na aula seguinte. O professor da sala de recursos pode ajudar nessa transcrição do texto dos alunos videntes para o braile e vice-versa. Amplie o tempo das atividades caso julgue necessário para que o estudante acompanhe todas as etapas.

Desenvolvimento
1ª etapa
Converse com os estudantes para elaborar um quadro espacial, social e cronológico do Brasil na passagem do século 19 para o 20. Dirija as falas para questões que envolvam o processo de inserção dos ex-escravos na sociedade. Os jovens têm de perceber que não bastava libertá-los: era preciso inseri-los socialmente com trabalho. Outro assunto da conversa deve ser o movimento migratório. Relacione-o com a substituição da mão de obra escrava e o contexto da Europa Ocidental. Explicite também o início do processo de industrialização e urbanização: já em meados do século 19, o assunto sofre influência de ideologias europeias. Tudo isso marcou os movimentos sociais no início da República. Fale sobre a distância (geográfica e social) entre sociedade civil e governo. Discuta de que forma a proclamação da república pode ter alterado o cotidiano da população. Destaque a diferença entre proclamação e construção da república: é nesse contexto que surgem os movimentos a estudar.

2ª etapa
Apresente uma linha do tempo com os movimentos sociais da República Velha (use como referência a linha do tempo da reportagem "As mobilizações sociais no início da República"). Explicite os agentes históricos e os locais. Cuide para que a turma não julgue que as informações já discutidas são as causadoras dos conflitos. Elas são parte do contexto.

3ª etapa
É hora de os alunos, divididos em grupo, realizarem seminários sobre os movimentos. Elabore questões para norteá-los. "Qual a importância da religiosidade na organização da Guerra do Contestado?" e "Como se caracterizava o comportamento das elites econômicas rio-grandenses no episódio da Revolução Federalista?".

4ª etapa
Ainda reunidos, os grupos devem responder por escrito como os movimentos sociais contribuíram para a realização do projeto republicano. Instrua a troca de respostas para que as formulações sejam analisadas. Ajude a eliminar pontos equivocados e destacar dados relevantes. Organize a devolução dos textos e a leitura.

5ª etapa
Reapresente a linha do tempo e discuta a proximidade temporal dos movimentos. Peça que respondam em duplas: "O que era o Brasil no início do século 20? Um novo país republicano ou um conjunto de revoltas que demonstravam descontentamento? Ou ambas as coisas?". Solicite a socialização das respostas a fim de que fique claro o quadro de convulsão social em um país que ainda não se via como tal.

Avaliação
Levando em conta o trecho da Constituição, peça que todos expliquem individualmente, e levando em conta a época e os movimentos, qual o sentido de "união indissolúvel" e o que quer dizer "todo poder emana do povo".


Cenas republicanas na linha do tempo

É fundamental apresentar aos alunos os movimentos sociais contextualizados e garantir que sejam estudados como levantes importantes para a configuração da política nacional.Veja abaixo os principais movimentos sociais que marcaram a história do Brasil.

1888  Abolição da Escravidão.

1889  Em novembro, proclamação da República.

1891  Em novembro, renúncia do Marechal Deodoro da Fonseca e posse de Floriano Peixoto.

1893 - Revolta Armada (Rio de Janeiro). Foto: Reprodução
1893  Revolta da Armada (Rio de Janeiro)
Setores minoritários da Armada eram a favor da restauração da Monarquia e a alta oficialidade da marinha se opôs a Floriano Peixoto na tentativa de esvaziar o poder que o exército tinha nesses momentos iniciais da República.

1893 - Revolução Federalista (Rio Grande do Sul). Foto: Reprodução
1893  Revolução Federalista (Rio Grande do Sul)
As elites gaúchas reclamavam do controle excessivo do governo sobre os estados, reivindicavam maior autonomia não necessariamente derrubando a República e se opunham aos republicanos.

1896 - Guerra de Canudos (Bahia). Foto: Reprodução
1896  Guerra de Canudos (Bahia)
Ao comprar material para construir uma capela o líder espiritual Antônio Conselheiro percebeu que foi enganado pelo vendedor e disse que reclamaria ao imperador. Ele não sabia que a Monarquia já tinha saído de cena. Os republicanos criam um inimigo imaginário e´ acusando os seguidores de Conselheiro de monarquistas declaram guerra a eles.

1904 - Revolta da Vacina (Rio de Janeiro). Foto: Reprodução
1904  Revolta da Vacina (Rio de Janeiro)
Época da reforma urbana do governo. A população pobre foi enxotada para a periferia e reprimida pelo Código de Posturas Municipais. O estouro da revolta ocorreu com a lei da vacinação contra a varíola. A população reclamava que os agentes de saúde invadiam as casas e obrigavam as mulheres a expor os braços e as pernas para receberem a injeção´ contrariando a moral familiar.

1910 - Revolta da Chibata (Rio de Janeiro). Foto: Reprodução
1910  Revolta da Chibata (Rio de Janeiro)
Os marinheiros amotinados em navios da marinha se rebelaram porque sofriam castigos físicos com açoites de chibata mas estavam descontentes também
com a relação de trabalho de cunho senhorial (os oficiais brancos) e escravista (os marinheiros negros e mulatos) os baixos salários e a falta de treinamento especializado.

1911 - Guerra do Contestado (Paraná e Santa Catarina). Foto: Reprodução
1911  Guerra do Contestado (Paraná e Santa Catarina)
O povo se revolta ao ser expulso de suas terras devido à construção de uma ferrovia e por ordem de uma madeireira que estava se instalando na região. comandado pelo líder espiritual José Maria reivindicava a posse das terras. Ele morre logo nos primeiros combates e seus seguidores esperam que ele ressuscite para instalar uma monarquia divina.

1913  Revolta de Juazeiro (Ceará). Foto: Reprodução
1913  Revolta de Juazeiro (Ceará)
Em uma região carente o padre Cícero Romão Batista manipulou o povo passando a mediar o diálogo entre as elites e a mão de obra sertaneja favorecendo os proprietários de terras. O poder de persuasão do religioso fez com que os sertanejos pegassem em armas para derrubar o governador do Ceará o que beneficiou uma família local, os Acioly.

1922 - Levante do Forte de Copacabana. O Jornal. Foto: Reprodução
1922  Levante do Forte de Copacabana (Rio de Janeiro)
Os Tenentes apesar de fazerem parte do exército, que detinha o poder governamental reivindicavam a modernização do país e o fim das práticas de voto de cabresto. Contaram com apoio de várias camadas dos setores médios urbanos como profissionais liberais funcionários públicos e pequenos comerciantes entre outros.

Matéria extraída da Revista Nova Escola, através do site http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/mobilizacoes-sociais-inicio-republica-608051.shtml?page=1

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